“Me abraça até passar a chuva ?”
Tinham se amado até a exaustão, mas ainda assim não conseguiam se separar. Os corpos ainda um.
“Fica aqui dentro pra sempre?”
Ela dizia sorrindo, com os olhos um pouco fechados.
“ Pra sempre.”
Ele respondia ainda entre as coxas daquela que tinha seu coração.
Silêncio naquele quarto. Somente um som muito suave de um Chet Baker tocando seu trompete. Os corpos abraçados sobre a cama que era o mundo daqueles dois.
Ela pensava na conta de luz que venceria no próximo dia 21, enquanto ele pensava no e-mail que havia deixado de enviar a um amigo. Depois ela pensava que precisava lavar a louça do jantar da noite passada, enquanto ele pensava que não podia deixar de regar suas plantinhas. Então ela pensava que era maravilhoso estar ali, abraçada ao seu amor mais uma vez, enquanto ele pensava exatamente a mesma coisa. Então se olharam novamente, praticamente no mesmo segundo. E sorriam docemente um pro outro e diziam com os olhos sorrindo que mesmo que a chuva passasse, nada teria fim.
Amor assim, acontece todo dia, e pra sempre.
Depois de mudos terem dito tantas coisas, se abraçaram mais forte e recomeçaram.
Escrito para o meu amor nos primeiros meses. No ínicio de nós dois.
terça-feira, 4 de dezembro de 2007
ASSIM NO CÉU COMO NA TERRA
A vida pra ela acabava assim, meio sem graça. Que nem maria-mole, arroz sem acompanhamento e partida de futebol sem gol.
Tinha lá seus cinqüenta e pouquinhos. Era bem jovem, e é bem verdade que não se pensava assim. Aliás, se comportava como se tivesse bem mais, como se já tivesse uns oitenta e muitos. Era chata, ranzinza, resmungona, e é bem verdade que gostava de maltratar os gatos da vizinhança jogando-lhes as águas sujas dos seus constantes “escalda pés”.
Porém, como não era de se esperar, foi para o céu. Não podia acreditar que sabendo ter sido anunciada várias vezes a encomenda de sua futura visita ao inferno, estivesse parada ali, diante daquela porta gigantesca, com maçanetas de argola sobre a fechadura. Resolveu espiar - coisa que fazia muito bem - aproximou-se da porta, encostou as mãos a fim de apoiar-se. Levantando os pés metidamente, inclinou o corpo em direção a fechadura. Com a cabeça já dentro da porta, olhou tudo o que pode ver. Achou aquilo tudo muito bonito e muito azul, com garotinhos peladinhos voando por todos os lados. Pôde finalmente constatar de que não se tratava do limbo. Olhou mais um pouco. Achou tudo muito interessante, mas depois de dez minutos passados, percebeu que aquilo tudo era muito lindo e bobo. Os bichos tinham asas! Gatos voadores... Até mesmo os vira-latas eram alados... Qual seria então a função dos passarinhos? Nesse lugar, seriam apenas como os pintos, com a diferença de que quando crescessem, não virariam galinhas.
Cansada de olhar, resolveu procurar por alguém que pudesse convidá-la a entrar. Tirou a cabeça da fechadura com certa dificuldade, pois havia dormido com “bobies” no cabelo, e, sendo assim, prendeu um deles num prego. “Merda!” - resmungou levando seguida e rapidamente uma das mãos à boca, temendo que alguém a tivesse ouvido, condenando eternamente sua entrada no céu. A porta de repente começou a ranger um rangido horrível. Percebeu que se abria. Teria tempo de soltar os cabelos? Não pensou duas vezes. Começou a puxar loucamente os “bobies” e os grampos. Terminou de arrancá-los exatamente quando um velhinho de walkman, túnica amarelinha e um cinturão cheio de chaves abriu a porta. Era São Pedro, tinha certeza. O velhinho se aproximou. Circulou em volta. Olhou estranhamente para sua cara despenteada... Aproximou-se e: “Com licença” - tirou um último “bobie” da cabeleira emaranhada. “Aqui é o céu?” - ao que ele respondeu: “Parece.”- Suspirou aliviada. “Seja bem vinda à eterna morada.”- Meu Deus! Ela mal podia acreditar!!! Finalmente a casa própria! Deu um dos braços ao velhinho e arrastando-o devagar pra dentro da porta, desabafou: “Que bom estar aqui! Sempre sonhei com este lugar... Sempre fui tão religiosa, sabe São Pedro... Sempre fui tão caridosa...” Era tudo mentira, mas o velhinho parecia nem desconfiar da louca que falava e falava e falava sem parar. São Pedro pacientemente ouvia, de vez em quando anotando alguns números cheios de algarismos em seu note book. De súbito a mulher resolveu calar-se. Parou também de andar. Fez uma cara de susto. Perguntou as horas. “Tem televisão?”
Num piscar de olhos estava sentada numa poltroninha bem confortável ao lado de gente muito estranha. “Ai, meu Senhor! E pensar que todos estes são meus irmãos...” Mal podia acreditar que mesmo no céu poderia ver a novela. “...E eu que pensei que ia pro inferno...” - Sorria tranqüíla, até que percebeu que um garotinho ajoelhado a sua frente escondia uma melequinha debaixo do sofá. “Garotinho porco! tirando meleca no céu! É muita cara de pau, hein, criança!” - Nesse momento um homem daqueles de armadura dos livros abriu a porta da sala e pegou a mulher pelo braço. “Me solta!” - “A senhora violou a lei da boa convivência, e como estava em seu período de experiência no céu, foi detida. Além disso, segundo os apontamentos de São Pedro, as informações sobre a senhora não foram nada favoráveis”. “Mas aquele menininho insolente estava tirando meleca! E ainda por cima passou debaixo do sofá! No céu, isso devia ser uma calamidade!” - O homem educadamente respondeu: “Minha senhora, o menino Jesus pode fazer o que quiser. Até mesmo colocar sua melequinha debaixo do sofá”...
E assim acabou a história da mulher ranzinza que foi assistir novela no lugar errado. Amém.
Escrito em 30 de agosto de 2 mil, tempo em que eu tinha mais tempo para escrever...
Tinha lá seus cinqüenta e pouquinhos. Era bem jovem, e é bem verdade que não se pensava assim. Aliás, se comportava como se tivesse bem mais, como se já tivesse uns oitenta e muitos. Era chata, ranzinza, resmungona, e é bem verdade que gostava de maltratar os gatos da vizinhança jogando-lhes as águas sujas dos seus constantes “escalda pés”.
Porém, como não era de se esperar, foi para o céu. Não podia acreditar que sabendo ter sido anunciada várias vezes a encomenda de sua futura visita ao inferno, estivesse parada ali, diante daquela porta gigantesca, com maçanetas de argola sobre a fechadura. Resolveu espiar - coisa que fazia muito bem - aproximou-se da porta, encostou as mãos a fim de apoiar-se. Levantando os pés metidamente, inclinou o corpo em direção a fechadura. Com a cabeça já dentro da porta, olhou tudo o que pode ver. Achou aquilo tudo muito bonito e muito azul, com garotinhos peladinhos voando por todos os lados. Pôde finalmente constatar de que não se tratava do limbo. Olhou mais um pouco. Achou tudo muito interessante, mas depois de dez minutos passados, percebeu que aquilo tudo era muito lindo e bobo. Os bichos tinham asas! Gatos voadores... Até mesmo os vira-latas eram alados... Qual seria então a função dos passarinhos? Nesse lugar, seriam apenas como os pintos, com a diferença de que quando crescessem, não virariam galinhas.
Cansada de olhar, resolveu procurar por alguém que pudesse convidá-la a entrar. Tirou a cabeça da fechadura com certa dificuldade, pois havia dormido com “bobies” no cabelo, e, sendo assim, prendeu um deles num prego. “Merda!” - resmungou levando seguida e rapidamente uma das mãos à boca, temendo que alguém a tivesse ouvido, condenando eternamente sua entrada no céu. A porta de repente começou a ranger um rangido horrível. Percebeu que se abria. Teria tempo de soltar os cabelos? Não pensou duas vezes. Começou a puxar loucamente os “bobies” e os grampos. Terminou de arrancá-los exatamente quando um velhinho de walkman, túnica amarelinha e um cinturão cheio de chaves abriu a porta. Era São Pedro, tinha certeza. O velhinho se aproximou. Circulou em volta. Olhou estranhamente para sua cara despenteada... Aproximou-se e: “Com licença” - tirou um último “bobie” da cabeleira emaranhada. “Aqui é o céu?” - ao que ele respondeu: “Parece.”- Suspirou aliviada. “Seja bem vinda à eterna morada.”- Meu Deus! Ela mal podia acreditar!!! Finalmente a casa própria! Deu um dos braços ao velhinho e arrastando-o devagar pra dentro da porta, desabafou: “Que bom estar aqui! Sempre sonhei com este lugar... Sempre fui tão religiosa, sabe São Pedro... Sempre fui tão caridosa...” Era tudo mentira, mas o velhinho parecia nem desconfiar da louca que falava e falava e falava sem parar. São Pedro pacientemente ouvia, de vez em quando anotando alguns números cheios de algarismos em seu note book. De súbito a mulher resolveu calar-se. Parou também de andar. Fez uma cara de susto. Perguntou as horas. “Tem televisão?”
Num piscar de olhos estava sentada numa poltroninha bem confortável ao lado de gente muito estranha. “Ai, meu Senhor! E pensar que todos estes são meus irmãos...” Mal podia acreditar que mesmo no céu poderia ver a novela. “...E eu que pensei que ia pro inferno...” - Sorria tranqüíla, até que percebeu que um garotinho ajoelhado a sua frente escondia uma melequinha debaixo do sofá. “Garotinho porco! tirando meleca no céu! É muita cara de pau, hein, criança!” - Nesse momento um homem daqueles de armadura dos livros abriu a porta da sala e pegou a mulher pelo braço. “Me solta!” - “A senhora violou a lei da boa convivência, e como estava em seu período de experiência no céu, foi detida. Além disso, segundo os apontamentos de São Pedro, as informações sobre a senhora não foram nada favoráveis”. “Mas aquele menininho insolente estava tirando meleca! E ainda por cima passou debaixo do sofá! No céu, isso devia ser uma calamidade!” - O homem educadamente respondeu: “Minha senhora, o menino Jesus pode fazer o que quiser. Até mesmo colocar sua melequinha debaixo do sofá”...
E assim acabou a história da mulher ranzinza que foi assistir novela no lugar errado. Amém.
Escrito em 30 de agosto de 2 mil, tempo em que eu tinha mais tempo para escrever...
segunda-feira, 15 de outubro de 2007
PARA VIVER EM PAZ
Para uma convivência de paz sobre a Terra o homem só precisaria respeitar algumas regras básicas: Os Dez Mandamentos e o Hino de seu país. É tão pouco, tão simples, tão óbvio e mesmo assim, ninguém enxerga.
LOBÃO PEIDOU
Lobão peidou. Quem peidou? Lobão. E nem precisou mostrar a mão amarela porque ele mesmo assumiu. Eu não consigo. Nem na vida real nem metaforicamente. Eu não peido. No máximo solto um pum. No banheiro. E por mais que meu “pum” tenha a potência de uma “peida”, chamo de pum. Se não consigo peidar, como declarar que “peido” para a situação do meu país? Jamais. Eu não.
Bem, o fato é que o Senado já passou da fase do “pum” faz tempo. Já não pode ser classificado como “peida” (um amigo diz que termos utilizados no feminino adquirem mais força). O Senado, a Câmara, a Presidência (ou vice-versa) já ultrapassaram os limites do que podemos considerar uma “cagada”. E agora? Não posso vestir a camiseta do movimento PEIDEI. Seria necessário trezentos mil corpos para vestir todas as camisetas que desejo estampar. Preciso de uma com a cara de um palhaço de braços cruzados e expressão emburrada. Acima poderia ler-se “ÓI NÓS AQUI TRAVEIZ...”. A intenção seria usar nas próximas eleições. Estou pensando seriamente em fazer várias e presentear amigos e parentes. Sim. Somos um bando de palhaços. Somos milhões, bilhões contra a CPMF e mesmo assim ela será aprovada pelos babacas que escolhemos para responder por nós. Escolhemos? Que merda. E não vamos fazer NADA! Já pensei em tirar meu dinheiro do Banco ou então comunicar à Empresa que me contrata que doravante só recebo em cash. Mas e aí? Guardo o dinheiro onde? Debaixo do colchão? Não há segurança para isso. Trabalho feito uma corna, longe pacas, gasto mais de 3 horas por dia para ir e voltar - exausta - e não posso dizer nada ao ser “garfada” pelo IR, pela CPMF, pelos impostos “embutidos” ou pelas lojinhas de 1,99 que nunca devolvem meu 1 centavo de troco. Se o reivindico recebo um olhar atravessado da atendente como se querer o MEU troco fosse um assalto. Gostaria de ter livre-arbítrio para decidir o que fazer com o MEU suado dinheiro, com meus investimentos e com o meu troco. Mas não... Não tenho poder sobre o pagamento pelo MEU trabalho. Alguém que se acha mais poderoso do que eu, decide onde e como aplicar meu dinheiro. MENTIRA. Não aplicam em NADA no Brasil. Aqui, só se rouba. Todo mundo rouba de todo mundo e meu marido ainda tem a audácia – ou inocência? - de dizer que o carioca que é malandro. Ei! Eu sou carioca! Nossos filhos idem! Sou absolutamente honesta e no que depender da educação que darei aos meus, eles também o serão.
Bem previu Ney Matogrosso: “Se correr o bicho pega, se ficar, o bicho come”. Estamos todos fodidos e atolados nesta merda que deixamos se instaurar. Será que a única coisa que nos resta fazer é rezar? Acho que até Deus perdeu a fé.
Bem, o fato é que o Senado já passou da fase do “pum” faz tempo. Já não pode ser classificado como “peida” (um amigo diz que termos utilizados no feminino adquirem mais força). O Senado, a Câmara, a Presidência (ou vice-versa) já ultrapassaram os limites do que podemos considerar uma “cagada”. E agora? Não posso vestir a camiseta do movimento PEIDEI. Seria necessário trezentos mil corpos para vestir todas as camisetas que desejo estampar. Preciso de uma com a cara de um palhaço de braços cruzados e expressão emburrada. Acima poderia ler-se “ÓI NÓS AQUI TRAVEIZ...”. A intenção seria usar nas próximas eleições. Estou pensando seriamente em fazer várias e presentear amigos e parentes. Sim. Somos um bando de palhaços. Somos milhões, bilhões contra a CPMF e mesmo assim ela será aprovada pelos babacas que escolhemos para responder por nós. Escolhemos? Que merda. E não vamos fazer NADA! Já pensei em tirar meu dinheiro do Banco ou então comunicar à Empresa que me contrata que doravante só recebo em cash. Mas e aí? Guardo o dinheiro onde? Debaixo do colchão? Não há segurança para isso. Trabalho feito uma corna, longe pacas, gasto mais de 3 horas por dia para ir e voltar - exausta - e não posso dizer nada ao ser “garfada” pelo IR, pela CPMF, pelos impostos “embutidos” ou pelas lojinhas de 1,99 que nunca devolvem meu 1 centavo de troco. Se o reivindico recebo um olhar atravessado da atendente como se querer o MEU troco fosse um assalto. Gostaria de ter livre-arbítrio para decidir o que fazer com o MEU suado dinheiro, com meus investimentos e com o meu troco. Mas não... Não tenho poder sobre o pagamento pelo MEU trabalho. Alguém que se acha mais poderoso do que eu, decide onde e como aplicar meu dinheiro. MENTIRA. Não aplicam em NADA no Brasil. Aqui, só se rouba. Todo mundo rouba de todo mundo e meu marido ainda tem a audácia – ou inocência? - de dizer que o carioca que é malandro. Ei! Eu sou carioca! Nossos filhos idem! Sou absolutamente honesta e no que depender da educação que darei aos meus, eles também o serão.
Bem previu Ney Matogrosso: “Se correr o bicho pega, se ficar, o bicho come”. Estamos todos fodidos e atolados nesta merda que deixamos se instaurar. Será que a única coisa que nos resta fazer é rezar? Acho que até Deus perdeu a fé.
domingo, 15 de julho de 2007
A PAZ
“Não consigo entender quem apunhala um coração e segundos depois tira o punhal do peito – ainda quente –, corta um pão e o lambuza com manteiga.”
Esse era o reincidente pensamento de D. Rosa às 3:46 da manhã. E não havia silêncio suficiente que a fizesse pregar o olho. Tudo o que mais queria era viver em paz. Mas temia que talvez a única possibilidade para realizar seu desejo fosse a morte. Virou o travesseiro de lado e o afofou um pouco. Amava seu marido ainda. Apesar do tempo, das brigas, das decepções, ainda o amava. Ajeitou o lençol cobrindo a orelha mas tomou cuidado para que o braço esquerdo ficasse de fora. Colocou 3 filhos neste mundo. Dois já criados e um já morando debaixo da terra. Morreu ainda bebê, levando todos os sorrisos de sua juventude e também dos anos futuros. Afofou novamente o travesseiro, com mais vigor e enfiou a cabeça na intenção de esconder o ouvido direito bem escondido. O marido dormia ao lado, pesadamente. Era tão silencioso – e ausente – que se não estivesse ali, talvez não a fizesse falta. Porém, a presença dele a deixava segura. D. Rosa tinha medo de fantasmas. Tinha certeza de que se visse algum e desse um grito, o marido a salvaria. Enganava-se. Ele sequer moveria um dedo. Talvez a empurrasse para proteger a si próprio. Era um grande egoísta. D. Rosa enfiava a mão direita debaixo do travesseiro e com a outra tapava a própria boca. Achou que fosse gritar e não queria acordar o cachorro. Não se importava com o marido, mas com o cachorro sim. Seu fiel companheiro. O ser que sabia de todos os seus segredos e que lhe lambera muitas lágrimas. Ela o amava. Às 4:13 descobriu que o amor pelo cão era maior do que o amor pelo marido. Abriu arregaladamente os olhos e, se descobrindo, virou abruptamente para o outro lado. Cobriu-se novamente esticando o lençol com a pinça do dedão e o dedo médio do pé. Um filme chato passava pela sua cabeça: sua vidinha medíocre. Queria saber o que seria se não fosse o que fora por todos estes anos. Pensou em tantas possibilidades que achou melhor logo esquecer para não piorar sua insatisfação com a vida. Pensava nas crianças. Eram filhos maravilhosos mas àquela altura da vida, já criados, tinham suas famílias e quase nenhum tempo para dedicar à mãe. Não sabia se achava melhor assim mas sabia que merecia descansar. Enfiou novamente a mão debaixo do travesseiro e quando deu por si eram 8:14. Adormeceu mas sentia o peso da insônia nas pernas e nas juntas dos dedos. Levantou-se e em jejum lavou a roupa que deixara de molho. O marido a esta altura já havia saído para trabalhar. Não lhe desejara “bom dia”. D. Rosa tomou um banho demorado. Lavou os cabelos delicadamente, passou sabonete duas vezes em cada axila, secou-se e passou talco e hidratante nos pés. Penteou os cabelos olhando-se no espelho. Via ali em algum lugar o rosto bonito da moça que fora. Sentiu inveja de si mesma. Tentou colocar um vestido vermelho que não lhe cabia há anos. Não passava do quadril. Colocou um vestido florido que odiava mas lhe era confortável. Olhou-se no espelho e a moça que fora havia sumido. Sentou-se à mesa de café, serviu uma xícara, colocou duas colheres pequenas de açúcar. Escolheu um pão adormecido bem clarinho, besuntou a faca de manteiga, passou no pulso direito, depois no esquerdo e cortou. Finalmente encontrou a paz.
Esse era o reincidente pensamento de D. Rosa às 3:46 da manhã. E não havia silêncio suficiente que a fizesse pregar o olho. Tudo o que mais queria era viver em paz. Mas temia que talvez a única possibilidade para realizar seu desejo fosse a morte. Virou o travesseiro de lado e o afofou um pouco. Amava seu marido ainda. Apesar do tempo, das brigas, das decepções, ainda o amava. Ajeitou o lençol cobrindo a orelha mas tomou cuidado para que o braço esquerdo ficasse de fora. Colocou 3 filhos neste mundo. Dois já criados e um já morando debaixo da terra. Morreu ainda bebê, levando todos os sorrisos de sua juventude e também dos anos futuros. Afofou novamente o travesseiro, com mais vigor e enfiou a cabeça na intenção de esconder o ouvido direito bem escondido. O marido dormia ao lado, pesadamente. Era tão silencioso – e ausente – que se não estivesse ali, talvez não a fizesse falta. Porém, a presença dele a deixava segura. D. Rosa tinha medo de fantasmas. Tinha certeza de que se visse algum e desse um grito, o marido a salvaria. Enganava-se. Ele sequer moveria um dedo. Talvez a empurrasse para proteger a si próprio. Era um grande egoísta. D. Rosa enfiava a mão direita debaixo do travesseiro e com a outra tapava a própria boca. Achou que fosse gritar e não queria acordar o cachorro. Não se importava com o marido, mas com o cachorro sim. Seu fiel companheiro. O ser que sabia de todos os seus segredos e que lhe lambera muitas lágrimas. Ela o amava. Às 4:13 descobriu que o amor pelo cão era maior do que o amor pelo marido. Abriu arregaladamente os olhos e, se descobrindo, virou abruptamente para o outro lado. Cobriu-se novamente esticando o lençol com a pinça do dedão e o dedo médio do pé. Um filme chato passava pela sua cabeça: sua vidinha medíocre. Queria saber o que seria se não fosse o que fora por todos estes anos. Pensou em tantas possibilidades que achou melhor logo esquecer para não piorar sua insatisfação com a vida. Pensava nas crianças. Eram filhos maravilhosos mas àquela altura da vida, já criados, tinham suas famílias e quase nenhum tempo para dedicar à mãe. Não sabia se achava melhor assim mas sabia que merecia descansar. Enfiou novamente a mão debaixo do travesseiro e quando deu por si eram 8:14. Adormeceu mas sentia o peso da insônia nas pernas e nas juntas dos dedos. Levantou-se e em jejum lavou a roupa que deixara de molho. O marido a esta altura já havia saído para trabalhar. Não lhe desejara “bom dia”. D. Rosa tomou um banho demorado. Lavou os cabelos delicadamente, passou sabonete duas vezes em cada axila, secou-se e passou talco e hidratante nos pés. Penteou os cabelos olhando-se no espelho. Via ali em algum lugar o rosto bonito da moça que fora. Sentiu inveja de si mesma. Tentou colocar um vestido vermelho que não lhe cabia há anos. Não passava do quadril. Colocou um vestido florido que odiava mas lhe era confortável. Olhou-se no espelho e a moça que fora havia sumido. Sentou-se à mesa de café, serviu uma xícara, colocou duas colheres pequenas de açúcar. Escolheu um pão adormecido bem clarinho, besuntou a faca de manteiga, passou no pulso direito, depois no esquerdo e cortou. Finalmente encontrou a paz.
quarta-feira, 11 de julho de 2007
O boneco roxo parte IV: Selando a paz
Semana passada liguei para meu amigo que deu o roxão pra Nina - Clécio - propondo que ele viesse pegar o boneco de volta. Ele teve a petulância de dizer que "não poderia recebê-lo". Não tinha espaço! Hahahaha! Ri muito. Bem, hoje um amigo muito amado veio visitar-me - Ricardinho - e num dado momento disse ter visto "álguém". Sim, ele tivera uma visão. Perguntei logo se era preto ou branco. Ele disse que era "do bem", com certeza. Contei-lhe sobre os episódios com o boneco roxo. Ele, muito otimista disse: "Vanessa, nesta casa há duas crianças. Você acha que não existem outros espíritos por aqui, brincando?" - Neste momento selou-se a paz entre nós: eu e o roxão. Acho que ele já pode ficar.
quarta-feira, 4 de julho de 2007
O boneco roxo - Parte III ou Rinite - Parte I
Quando percebo que perdi o controle sobre as coisas que deveria controlar, me ataca a rinite. É praticamente instantâneo. A única coisa que me deixou feliz hoje - além de saber q meus filhos estão lindos e saudáveis - é ter menos 2kg. Sim, pesei na balança cruel do banheiro mais cedo.
O desgraçado do boneco roxo riu hoje umas 5 vezes. Inacreditável. Não senti medo ainda. Eu disse AINDA, por hoje. Às vezes acho que ele tá rindo da minha cara. É possível mesmo que esse cara esteja debochando de mim. Tô uma pilha hoje. Tudo dando errado. Porque eu não entendo de uma vez por todas que licença-maternidade é pra cuidar do bebê MESMO e páro de querer ajudar à todos os pedintes? Porque eu não páro uma vez na vida de querer resolver os problemas dos outros e resolvo os meus que já são muitos? Meu nariz não pára de coçar. Que saco! Ainda bem que comprei 3 caixas de lenço. Duas do Rei Leão e uma das Princesas. 99 centavos no Mundial...
Sinceramente, vontade de dormir e acordar amanhã um pouco cruel. Amanhã não quero querer ajudar a ninguém, só fazer o que estiver ao meu alcance, POR MIM MESMA que tô ficando por último. Ainda não retifiquei meu IR 2006 e fico querendo abraçar o mundo com as pernas! Alguém me interna, por favor!! Alguém me faz entender que eu tenho que aprender que não posso tudo! EU NÃO SOU A MULHER MARAVILHA! Até porque a mulher maravilha não tem espinhas e eu tenho 3 e tô secando com nicotinamida 4%.
O desgraçado do boneco roxo riu hoje umas 5 vezes. Inacreditável. Não senti medo ainda. Eu disse AINDA, por hoje. Às vezes acho que ele tá rindo da minha cara. É possível mesmo que esse cara esteja debochando de mim. Tô uma pilha hoje. Tudo dando errado. Porque eu não entendo de uma vez por todas que licença-maternidade é pra cuidar do bebê MESMO e páro de querer ajudar à todos os pedintes? Porque eu não páro uma vez na vida de querer resolver os problemas dos outros e resolvo os meus que já são muitos? Meu nariz não pára de coçar. Que saco! Ainda bem que comprei 3 caixas de lenço. Duas do Rei Leão e uma das Princesas. 99 centavos no Mundial...
Sinceramente, vontade de dormir e acordar amanhã um pouco cruel. Amanhã não quero querer ajudar a ninguém, só fazer o que estiver ao meu alcance, POR MIM MESMA que tô ficando por último. Ainda não retifiquei meu IR 2006 e fico querendo abraçar o mundo com as pernas! Alguém me interna, por favor!! Alguém me faz entender que eu tenho que aprender que não posso tudo! EU NÃO SOU A MULHER MARAVILHA! Até porque a mulher maravilha não tem espinhas e eu tenho 3 e tô secando com nicotinamida 4%.
terça-feira, 3 de julho de 2007
O boneco roxo - parte II
Esta madrugada minha mãe disse que acordou com a gargalhada do roxão. Disse que estava tendo um sonho ruim e acordou com a gargalhada. Deus do céu! Preciso dar um fim nesta maldição.
O boneco roxo, berinjela, esquisito... poltergeist
Minha filha ganhou um boneco roxo, pelúcio, com um sorriso largo e olhos grandes. Jeitinho de monstro fofo. Melhor, jeitinho de monstro tentando ser fofo. Ou jeitinho de fofo pra fingir não ser monstro. O que ele faz de interessante? Bem, ao apertar uma de suas mãos ele treme todo, gargalha e diz: "Pára! Ai que cócegas!" - Nina deu atenção no primeiro dia, depois esqueceu o roxão. Bem, o fato é que um dia, numa das viagens do meu marido em que eu dormia em casa sozinha (odeio) com as crianças, o monstro berinjela soltou uma gargalhada às 3 da madruga. Dei um pulo da cama, assustada. Durmo com a porta deles aberta e a babá-eletrônica ligada. Imaginem o tamanho do salto que dei... Corri até o quarto (me cagando de medo, lógico), peguei o desgraçado e o "escondi" no quarto de empregada. Mãe não tem nem direito de ter medo! Lembrei de uma história que Dr. Fábio contou sobre um boneco que nosso amigo Pacheco havia dado para o filho e que também fazia essas artes sozinho, sem ser tocado por seres humanos... Tive medo. Acho sim que existem bonecos poltergeist. Pensei em dá-lo à netinha da minha empregada mas achei que seria uma tremenda sacanagem. Parece aqueles finais de filme de terror da infância onde a maldição era sempre passada adiante, para uma nova família com criancinhas inocentes e musiquinhas macabras pra dar o clima. Fade out. Cruz credo...
segunda-feira, 2 de julho de 2007
Rabo de Foguete
Quando eu era criança e ouvia dizer que alguém havia “sumido”, imaginava a pessoa agarrada num rabo de foguete, num cometa, esfregando a lâmpada do Aladim, sei lá. Sempre achei que quando fosse adulta, faria igual. Precisei crescer para entender que por mais que se deseje, sumir é algo impossível. Deixar de existir deveria ser um desejo indesejável já que não pode ser cumprido. E comecei a pensar na infinidade de coisas que desejamos quando somos crianças e que quando crescemos somos obrigados a engolir a dura verdade da inexistência e da impossibilidade de realizar. Papai Noel, por que me abandonaste?
quinta-feira, 5 de abril de 2007
POEIRA
Vejo fotos de uma época onde ríamos de tudo.
Ou quase.
Fotos felizes cobertas de poeira.
Era uma época onde as portas não eram batidas.
Você procura papéis barulhentamente,
enquanto eu - tentando manter a calma -,
irritantemente enrolo a pontinha da fronha.
Vontade de ter uma resposta para cada vazio.
Vontade de ter o filho,
de ter paz,
de ter paciência ao quadrado.
Você se transformou num cara mudo, surdo e impaciente.
E reclama que eu não falo mais.
E eu quase grito!
O mais triste é que acho que a culpa é minha.
Não sei o que fazer pra voltar no tempo.
Você soca a tampa da garrafa na cozinha.
Ouço do quarto.
Bate a porta do banheiro de empregada.
Ouço do quarto.
Faz cara de quem sumiu, ou morreu.
(sinto do quarto)
Eu ainda estou aqui.
Talvez seus papéis estejam onde sempre estiveram:
na sua mesa do trabalho.
E eu - até quando? - estou aqui.
Ou quase.
Fotos felizes cobertas de poeira.
Era uma época onde as portas não eram batidas.
Você procura papéis barulhentamente,
enquanto eu - tentando manter a calma -,
irritantemente enrolo a pontinha da fronha.
Vontade de ter uma resposta para cada vazio.
Vontade de ter o filho,
de ter paz,
de ter paciência ao quadrado.
Você se transformou num cara mudo, surdo e impaciente.
E reclama que eu não falo mais.
E eu quase grito!
O mais triste é que acho que a culpa é minha.
Não sei o que fazer pra voltar no tempo.
Você soca a tampa da garrafa na cozinha.
Ouço do quarto.
Bate a porta do banheiro de empregada.
Ouço do quarto.
Faz cara de quem sumiu, ou morreu.
(sinto do quarto)
Eu ainda estou aqui.
Talvez seus papéis estejam onde sempre estiveram:
na sua mesa do trabalho.
E eu - até quando? - estou aqui.
terça-feira, 6 de março de 2007
TRANQUEIRAS CHIC
Meu marido vive implicando pq eu adoro juntar tranqueira!! Sabe uma coisa q eu adoro? Sacola!! Tenho uma infinidade delas!! Daí ele fala: "Nenê, pra q vc precisa de tanto saco??" - e a minha resposta justificando: "e se a gente precisa visitar alguém e levar uma coisinha? Vamos levar num saco de supermercado? Não! Levo numa bolsinha da Zara!" – Homens jamais compreenderão tamanha sagacidade e requinte.
Escrito em 2006. Não lembro o mês.
Escrito em 2006. Não lembro o mês.
GRIPE
Dormi mega mal esta noite. Um super calor, ventilador ligado. Dor de garganta, nariz entupido e cabeção... Levantei umas 8 mil vezes para regular a intensidade do vento. Frio, frio... Calor, calor... Frio, frio... Levantar, fazer xixi, conferir a temperatura da Nina, verificar a entrada de luz por entre a cortina... Será q estou neurótica além de cabeçuda? O último xixi é feito quando já é quase dia. Dá tristeza saber que em pouquíssimas horas estarei de pé. Saudade de quando eu era adolescente e podia dormir mega muito. Ah, se as crianças entendessem isso... e se os adolescentes compreendessem o quão felizes são por poderem dormir... Se eu pudesse escolher um dia de sono para reviver seria um ocorrido numa ida para Teresópolis. Lembro de ter ido dormir cedo e acordar no final da tarde do outro dia! Totalmente refeita! Ai, ai... Delícia. Abençoadas sejam as noites bem dormidas!!
domingo, 4 de março de 2007
DEPRESSÃO PRÉ-PARTO ou DOMINGO?
Bem, se existe este tipo de deprê, é por este calvário que estou passando. E sinto-me caminhando sozinha pelo deserto, carregando a cruz farpada de madeira. Uma vontade ininterrupta de chorar. Desejo de sumir, de párar o tempo, de alterar a intensidade da luz do sol, de deletar algumas milhões de pessoas apressadas, mal-educadas e gritalhonas das ruas, voltar no tempo (ou acelerar o ciclo dos dias) e ter a inútil certeza e que tudo será como antes, ou ainda, q tudo será como deveria ser. Não sou eu quem governa os dias. E nem queria ser. Seria uma imensa idiotice querer ser DEUS. Tudo o que eu quero é um pouco de paz pra minha alma cansada. Falando assim, pareço uma pobre moribunda, mas este é meu "estado de espírito". E que merda de "estado", hein?
Meus pés além de inchados estão com deliciosas bolhas coçantes entre os dedos. Minha mão esquerda não suporta mais o aperto da aliança. Tive que tirá-la com sabão. E doeu pacas. Achei q fosse ficar presa pra sempre e grangrenar!!
O que melhora tudo é o sorriso da minha filha. Ela acabou de vir aqui e dizer: "Mamãe, vamos esperar o tempo passar lá no restaurante?" - Vou aceitar o convite. Assim o domingo acaba mais depressa.
Meus pés além de inchados estão com deliciosas bolhas coçantes entre os dedos. Minha mão esquerda não suporta mais o aperto da aliança. Tive que tirá-la com sabão. E doeu pacas. Achei q fosse ficar presa pra sempre e grangrenar!!
O que melhora tudo é o sorriso da minha filha. Ela acabou de vir aqui e dizer: "Mamãe, vamos esperar o tempo passar lá no restaurante?" - Vou aceitar o convite. Assim o domingo acaba mais depressa.
quinta-feira, 1 de março de 2007
O peso do cérebro
Dizem estudos científicos que o peso de um cérebro adulto varia entre 1.300 e 1.400 gr. , o que equivale a 2% do peso de uma pessoa. Porém, existem dias que - metaforicamente, embora não pareça - esse peso dobra, triplica, quadruplica. Não me refiro a dias de ressaca e sim àqueles dias em que a gente já acorda com "cabeção"... Um cabeção pesadíssimo, um mau-humor insuportável e uma dor indescritível nos ombros, nas pernas, nos olhos e no "saco"(que não tenho) ...
Esses sim são dias em que sentimos o verdadeiro peso de pensar. E como pesa o cabeção, nossa!! às vezes, não há o que alivie.
Não sou do tipo que toma chopp pra relaxar. Também não sou usuária de tarja preta. Sou do tipo que se obriga a dar uma corridinha na praia pra ativar a adrenalina mas, grávida de 8 meses, fazer o quê? Suportar o peso do cabeção. E da barriga, lógico. Bem, o que me resta é ver um pouquinho de Friends...
Esses sim são dias em que sentimos o verdadeiro peso de pensar. E como pesa o cabeção, nossa!! às vezes, não há o que alivie.
Não sou do tipo que toma chopp pra relaxar. Também não sou usuária de tarja preta. Sou do tipo que se obriga a dar uma corridinha na praia pra ativar a adrenalina mas, grávida de 8 meses, fazer o quê? Suportar o peso do cabeção. E da barriga, lógico. Bem, o que me resta é ver um pouquinho de Friends...
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